Fernanda Soares
Fernanda Soares

01/07/2013, 09h


O I Encontro Nacional LGBT da CSP-Conlutas é o primeiro encontro realizado por uma Central Sindical no país, de acordo com os participantes, que deram caráter histórico para o evento. Houve a participação de 180 pessoas, entre delegados, observadores e convidados. Mais de 16 estados de norte a sul do país estavam representados.

No sábado (29), mesas redondas sobre Conjuntura Nacional LGBT e sobre Opressão e Exploração, além dos grupos setoriais de discussão que ocorreram ao final do dia, enriqueceram os debates e a troca de experiências sobre os desafios e perspectivas dos LGBTs.

Conjuntura LGBT - A mesa redonda sobre a conjuntura da Luta LGBT foi composta por Flavio Bandeira do Setorial LGBT da CSP-Conlutas, por Tarcisio Ramos do movimento Somos Todos Coloridos, Jean Santana, dirigente do Andes-SN e pelo estudante Lucas Brito da Anel.

O membro do Setorial LGBT da CSP-Conlutas iniciou sua fala dando destaque para o ato realizado na noite anterior pelo Dia Nacional do Orgulho LGBT. “Resgatamos uma data [Dia do Orgulho LGBT] que foi apagada pelos movimentos sociais. Uma salva de palmas para nós”, disse.

Flavio fez uma análise das mobilizações em curso no país. “Mais de dois milhões de pessoas foram às ruas para dizer que não é apenas por vinte centavos, mas é também contra os gastos com a copa, é por mais investimento em saúde e educação”, salientou.

A importância dos LGBTs nesse contexto também foi ressaltada pelo membro do Setorial LGBT da CSP-Conlutas. “Não há como não falar de como nós [LGBTs] nos somamos a esses atos”.

Segundo o representante do Setorial LGBT, o cenário está se apresentando com novos elementos entre eles a escolha de um homofóbico, o Marcos Feliciano, para presidir a Comissão de Direitos Humanos. “Isso, dentre outros elementos, só ‘coroou’ o que representa os 10 anos de governo do PT”.

Alguns dos elementos elencados por Flavio foram: “O projeto de Cura Gay – que significa um retrocesso de vinte anos. O veto ao Kit contra a Homofobia. E a presidente Dilma não se pronunciou e continua inerte aos nosso anseios” , avaliou.

Esses temas dividem a sociedade, por isso, para Flavio, o encontro é importante para disputar a consciência e preparar os trabalhadores sobre a luta LGBTs. “Esse é um momento histórico e queremos fazer um chamado. As centrais irão fazer um dia de luta 11 de julho e precisamos nos somar e incluir nessa luta a derrubada de Feliciano. Colocar essa reivindicação para o conjunto da classe”.

De acordo com Flavio, a discussão de classe se perdeu e a substituíram pela palavra cidadania em que a burguesia se apropria e a utiliza de forma indevida. “A gente quer construir uma agenda de LGBT de luta e classista. Na sociedade capitalista não conseguiremos acabar com a homofobia, por isso precisamos lutar por uma sociedade socialista”.

Tarcisio Ramos, da Comissão Organizadora do encontro e do movimento Somos Coloridos, fez um breve resgate histórico sobre a questão LGBT. Desde o surgimento da Igreja que veio junto com o questionamento da sexualidade. Passou também pelo cristianismo que durante a ocupação no Império Romano, dentre as doutrinas, fazia a caça aos homossexuais. Citou ainda o Nazismo, em que os homossexuais, levados aos campos de concentração, eram diferenciados com Triângulo Rosa, entre outros períodos históricos.

“A perseguição aos homossexuais intensifica-se sempre em períodos de crise do sistema econômico. Eles se aproveitam da oportunidade da crise para encontrar alguém para ser oprimido para assim mudar o foco da crise. Aqui a gente não discute opressão pela opressão, mas sob a ótica do capitalismo”, explicou Tarcisio. Para ele, a conjuntura internacional não é boa, “Na África, em ao menos 13 países, condenam a morte os homossexuais”.

Tarcisio destacou que também aqui no Brasil, num governo que se diz de esquerda, a situação não é diferente. “O governo Lula enganou os LGBTs e não colocou nossas pautas nas discussões. Hoje a Dilma estava no jornal com bandeira LGBT, mas a Dilma não nos representada. Prova disso, é ela ter assinado uma carta fundamentalista que ataca os LGBTs”, avaliou.

Em seguida, o representante da Anel, Lucas Brito, falou sobre a importância do movimento estudantil em unidade com LGBTs no combate à homofobia. “Nós, da Anel, assim como a CSP-Conlutas, temos construído importantes lutas no campo dos LGBT. Temos grandes tarefas pela frente. Se nas ruas conseguimos derrubar o aumento das passagens é nas ruas que conseguimos derrubar Feliciano”, disse.

O representante do Andes, Jean Santana, destacou a importância desse evento que foi construído pelos trabalhadores, de forma autônoma, sem o financiamento de empresas e do governo.

Falou da experiência em seu sindicato, como seminário sobre a diversidade sexual promovido pelo Andes-SN. Também citou o congresso realizado pela entidade no qual foi aprovado uma política de combate à homofobia.

O representante do Andes-SN fez referencia às mobilizações em curso e salientou a importância de os LGBTs organizados participarem e dar uma direção de classe para esse processo. “As bandeiras pelo Fora Feliciano começaram a aparecer depois de nossa intervenção, precisamos disputar as nossas pautas”, avaliou.

Logo após o debate de conjuntura as inscrições foram abertas para que o plenário pudesse expor suas impressões. Os presentes enriqueceram o debate com as suas experiências em seus locais de trabalho e no convívio com a sociedade.

Um vídeo com representantes de outros países expondo suas lutas também foi apresentado.


Parte da tarde é dedicada ao debate sobre Opressão e Exploração


A mesa foi composta por Camila Lisboa, do Movimento Mulheres em Luta, Iraci Lacerda da Oposição Alternativa Apeosp, da subsede Santo André, pelo coordenador do Sindsef-SP Carlos Daniel, pelo presidente do Sindicato dos Metroviários de São Paulo, Altino Prazeres, e por Renato Gomes, do Sindicato dos Comerciários de Nova Iguaçu.

Camila abriu o debate mencionando como “capitalismo transforma diferenças em desigualdades”. Para ela, isso acontece pois no capitalismo há necessidade de lucro e portanto de superexploração da classe trabalhadora e de determinados setores sociais.

“Nós queremos organizar a luta contra a opressão e eliminá-la. Isso só será possível com a transformação da sociedade. Para isso, precisamos escolher um lado e é o lado da classe trabalhadora, que compõem mulheres, negros, LGBTs. Não podemos deixar a as organizações burguesas e capitalistas se apropriem”, frisou.

Para ela é preciso incorporar as demandas de luta contra a opressão e é essa batalha que ocorre na condução da CSP-Conlutas.

Discurso emocionado – Renato, do Sindicato dos Comerciários de Nova Iguaçu, fez um discurso emocionado sobre o preconceito que sofreu. “No meu sindicato eu me assumi como homossexual, alguns setores que compunham o sindicato queriam me tirar, mas outros companheiros me apoiaram e eu não desisti. Esse encontro me dá mais força para enfrentar o preconceito”, disse emocionado. Renato também falou do ascenso das manifestações e de que há mudança de animo da classe trabalhadora. “Nós não podemos deixar que as nossas bandeiras sejam excluídas, porque nós nunca dormimos”.

Iraci, professora da rede publica estadual, falou da homofobia nas escolas e do problema que o adolescente homossexual encara sem o suporte necessário.

Altino, do Sindicato dos Metroviários, destacou que a sociedade capitalista se interessa para que as pessoas se dividam, “é por isso que os LGBTs devem ir para as ruas organizados”.

Grupos de discussões – Ao final, os presentes se reuniram em grupos de trabalhos que discutiram diversos temas, bem como um manifesto para ser votado no domingo (30).

No terceiro dia, palestra sobre história do movimento LGBT e votação das resoluções


O integrante do Movimento Quilombo Raça e Classe, Wilson Honório, fez uma palestra descontraída com um breve resgate sobre a história dos LGBTs. A luta contra a ditadura, em 78, a unidade com os trabalhadores metalúrgicos do ABC na década de 80, entre outros episódios importantes foram elencados por ele. “É preciso nos localizarmos de qual é a história do movimento LGBT sob uma ótica classista, contra a lógica burguesa e de opressão”, explicou.

Essa história parte de Stonewall, “não era a classe média que ali estava, que podia pagar para sua socialização, mas sim os pobres que sofriam com a homofobia”.

“A nossa identidade surge do gueto, na minha rua, a Frei Caneca, podemos usar nossa “plena cidadania”, mas em outros lugares a gente pode levar porrada”, destacou.

Wilson disse que os LGBTs devem lutar por sua liberdade e saber diferenciar a privada ( aquela que é comprada) e a pública. “Nossa liberdade deve ser publica. Não defendemos a cidadania paga”. Wilson também citou os artistas e lideres homossexuais que fizeram história, como Leonardo Da Vinci, Michelangelo. Exemplos de pessoas que se colocaram contra o sistema.

Para ele, o movimento LGBT nasce da crise do capitalismo que deve ser superado e combatido. “Não podemos tratar a opressão de forma conciliatória”.

Citou o movimento conhecido como “Pink Money” que surgiu com a burguesia que é o que move a Parada Gay. “Isso nada mais é que comercialização e mercantilização do movimento”. “A nossa diferença com o resto do movimento é concreta. Em 2008, fomos expulsos da Parada gay”.

“Vamos construir a consciência dos operários para que tenham acumulo sobre as questões LGBTs, mulheres, negros. Defendo a igualdade de diretos para exercemos nossas diferenças”, finalizou.

Manifesto e resoluções – Na parte da tarde, foi apresentado e aprovado um manifesto sobre o Encontro e a situação atual dos LGBTs bem como as resoluções discutidas no encontro. Em breve iremos divulgar todas no site da Central.